Especialista alerta para a diferença entre planejamento lícito e simulação societária, e reforça que a verdadeira proteção patrimonial está na transparência.
A recente Operação Sem Desconto, deflagrada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, trouxe novamente ao centro do debate público o uso das holdings patrimoniais como instrumentos de gestão, sucessão e proteção de bens. A investigação apura um suposto esquema bilionário de descontos indevidos em benefícios previdenciários e cita nomes de destaque do meio jurídico e empresarial.
Embora não haja qualquer juízo de culpabilidade, já que todos os investigados se favorecem da presunção de inocência garantida pela Constituição, o episódio reacende a discussão sobre a linha tênue entre o planejamento patrimonial legítimo e a utilização indevida de estruturas societárias para fins de disfarce contábil.“O uso de holdings é um ato legítimo e, em muitos casos, recomendável.
O problema começa quando a estrutura é criada apenas para mascarar a propriedade de bens ou movimentações financeiras sem correspondência econômica real”, explica o advogado tributarista Tiago Leonardo Juvêncio, especialista em planejamento patrimonial e tributário.Segundo o advogado, a forma jamais pode se sobrepor à substância jurídica. “Se uma holding não possui escrituração adequada, receita compatível e gestão efetiva, ela passa a despertar suspeitas, mesmo que sua constituição tenha sido inicialmente legítima.
É justamente por isso que o instituto deve ser defendido e preservado, desde que utilizado com transparência e boa-fé”, complementa.Transparência como a nova blindagemCom o avanço da integração de dados entre Receita Federal, Coaf e Banco Central, a opacidade de estruturas societárias deixou de ser um escudo. “Hoje, a verdadeira blindagem patrimonial é a transparência. Escrituração contábil fidedigna, contratos coerentes e alinhamento entre fluxo financeiro e atividade econômica são os verdadeiros instrumentos de proteção jurídica”, ressalta Juvêncio.
O especialista lembra que, em diversos setores, especialmente no imobiliário e em estruturas de sucessão familiar, as holdings continuam sendo ferramentas valiosas, desde que amparadas pela legalidade e pela boa governança. “No país da formalidade esperta, a esperteza perdeu o charme. A lei continua sendo o melhor abrigo, desde que não se tente usá-la como esconderijo”, pontua.O advogado reforça que o debate gerado pela Operação Sem Desconto deve servir para educar o mercado, não para condenar indivíduos. “O instrumento é neutro.
O uso que se faz dele é que define sua natureza. O momento exige maturidade para separar a ferramenta lícita da sua deturpação. E, até que haja sentença transitada em julgado, deve prevalecer o respeito e a presunção de inocência”, conclui Juvêncio.

Tiago Juvêncio
